No período da quarentena imposta pela pandemia do coronovírus, uma das reclamações mais frequentes quanto à suspensão de atividades laborais é a excessiva quantidade de horas que os professores estão sendo obrigados a suportar em virtude de aulas e atividades online que lhes tomam muito mais tempo que as atividades rotineiras no espaço físico da escola. Os professores se veem assoberbados tanto quanto ao preparo do material, o qual é totalmente diverso do habitual, quanto à metodologia a ser empregada na educação à distância, visto que a maioria não tem formação e prepara para tanto, o que os torna também alunos virtuais em busca de tutoriais diversos para literalmente “aprenderem a ensinar”.
Isso sem mencionar os gastos extras que estão tendo com equipamentos e estrutura, os quais não estavam provisionados em seus orçamentos, e o fato de estarem em casa à disposição de seus filhos, tutorando as atividades escolares deles, o que implica numa sobrecarga diária de afazeres que exorbitam sua rotina. Esses excessos vividos por professores (que também são pais) têm desmotivado a docência, causando desgastes diários que os impactam também psicologicamente, inclusive porque não terão nenhum período de descanso antes do retorno às aulas pós-quarentena. Significa dizer que estes profissionais retornarão à rotina de trabalho totalmente desgastados, esgotados física e psiquicamente, e até mesmo adoecidos. Nesse sentido, não é outra a constatação da Presidente do Sindicato dos Professores de Minas Gerais (SINPRO-MG), Valéria Morato, manifesta em jornal de grande circulação no dia 09 de abril de 2020: “Os professores deixaram o presencial para virarem praticamente youtubers”. As escolas tratam a educação como mercadoria e o aluno como cliente, sem se preocupar com a parte cidadã, que também faz parte da educação. (…) Liminar da Justiça permite o trabalho virtual dos professores, desde que sejam ofertadas pelas escolas as condições adequadas para exercê-lo.
(Disponível em: www.em.com.br/app/noticia/gerais/2020/04/09/interna_gerais,1137294/professores-de-mg-denunciam-sobrecarga-de-trabalho-mais-de-12h-por.shtml?utm_source=whatsapp&utm_medium=social?utm_source=whatsapp&utm_medium=social. Acesso em 10/04/2020).
A liminar referida é da lavra da Desembargadora do TRT-3ª Região, Camilla Guimarães Pereira Zeidler, datada de 27 de março de 2020, em cuja decisão reconhece a possibilidade de utilização da educação remota neste momento desde que haja recursos disponíveis para tanto. Assim se posiciona no decisum: “desde que haja a utilização de recursos tecnológicos que dispensem o comparecimento físico dos alunos, professores e demais profissionais às dependências da instituição de ensino é possível o prosseguimento das atividades relacionadas ao ensino à distância (EaD), bem como à substituição das aulas presenciais por aulas em meio digital”. Entretanto, a julgadora destaca que “as instituições de ensino, cientes dos riscos impostos à coletividade pela pandemia causada pelo ‘Coronavírus’, devem empreender todos seus esforços, inclusive mediante a adoção dos diversos mecanismos tecnológicos disponíveis para que prevaleça a ordem de suspensão das atividades nas dependências das entidades…”. E arremata com a seguinte advertência: “O momento exige das instituições de ensino, dos professores e demais profissionais disposição para o aprimoramento e desenvolvimento de novas competências técnicas e de relacionamento interpessoal, dessa forma, aqueles professores que tem alguma dificuldade para lidar com recursos tecnológicos podem receber o auxílio ou as orientações pertinentes de forma não presencial”.
A decisão em questão foi proferida em período posterior à edição da Medida Provisória 927, de 22 de março de 2020, e confirma decisão exarada anteriormente. No dia 1º de abril temos a edição da Medida Provisória 936/2020. Ambas trazem medidas excepcionais para o Direito do Trabalho brasileiro, justificadas no próprio texto da MP 927/2020, no Art. 1º, Parágrafo único, que considera a pandemia caso de força maior amparado pela CLT, nos seguintes termos: “O disposto nesta Medida Provisória se aplica durante o estado de calamidade pública, reconhecido pelo Decreto Legislativo nº 6, de 2020, e, para fins trabalhistas, constitui hipótese de força maior, nos termos do disposto no art. 501 da Consolidação das Leis do Trabalho, aprovada pelo Decreto-Lei nº 5.452, de 1º de maio de 1943”.
Entre as medidas de exceção trazidas, interessa-nos particularmente as relativas ao teletrabalho, categoria jurídica que se aplica ao enfrentamento da questão posta nesse texto: qual a tutela devida à educação remota no formato online que tem sido praticada nesse período de quarentena? A esta pergunta soma-se outra: como ficam os excessos cometidos contra os professores, os quais têm trabalhado até mais de doze horas diárias e ainda se endividado em virtude da necessidade de gastos com equipamentos e estrutura, tal como os sindicatos veem noticiando?
Fonte: Estadão